Elogio ao Ócio
Por
que não conseguimos ficar sem fazer nada? A maior parte das coisas que dizemos
e fazemos é inútil. São palavras de meu velho amigo Mário, um homem sábio do
interior. Imagino que ele tenha se inspirado, nessa frase de imensa sabedoria,
em Sêneca, seu filósofo predileto. Imagino, não. Tenho certeza. Mário sempre
gostou de citar expressões deliciosamente ferinas de Sêneca relativas à idéia
do esforço em vão, do suor vertido por nada ou quase nada. Uma delas: agitação estéril.
Outra: preguiça excitada.
Lembro-me de ouvir Mário contar que Sêneca comparava as ações inúteis ao trabalho das formigas que descem e sobem o tronco da árvore sem nenhum propósito. Prometi a ele que, se um dia vencer minha preguiça invicta de ler filósofos, minha escolha de leitura será Sêneca. Enquanto isso me sirvo das palavras transmitidas por meu amigo.
Lembro-me de ouvir Mário contar que Sêneca comparava as ações inúteis ao trabalho das formigas que descem e sobem o tronco da árvore sem nenhum propósito. Prometi a ele que, se um dia vencer minha preguiça invicta de ler filósofos, minha escolha de leitura será Sêneca. Enquanto isso me sirvo das palavras transmitidas por meu amigo.
Olho
para o espelho e concordo: quase tudo o que faço e digo não serve para nada. E,
no entanto sinto dificuldade em deixar as atividades sem razão ou utilidade.
Penso que isso acontece com quase todo mundo. Uma dificuldade poderosa de ficar
sem fazer nada. Simplesmente contemplando as coisas. Refletir sobre nós mesmos.
Não nos permitimos o ócio. Pegar uma sessão das 2 no meio da semana. Tomar um
sorvete na praça no meio da tarde. Ou simplesmente fechar os olhos e pensar.
Estamos sempre fugindo de nós mesmos. Fugindo de nós mesmos: claro que essa
frase de gênio não é minha.
Parecer
ocupado é considerado importante, mais do que estar mesmo ocupado. Na vida corporativa, isso chega a extremos de comédia. Li numa revista que uma
empresa de recolocação de executivos desempregados arruma para eles escritório
e secretária para que simulem atividade. (E fujam de si mesmos, ocorre-me).
Soube que as empresas fazem planos de cinco a dez anos. As coisas mudam tanto,
o tempo inteiro: faz sentido planejar um futuro distante? Estarão vivos os
planejadores? Estarão vivas as premissas nas quais os planos se basearam?
Suspeito que tudo isto se encaixe no que Sêneca chamou de agitação estéril.
Sou uma escritora barata. Não tenho carteira de trabalho. Mas gostaria de lembrar uma frase preferida de Mário, que fez uma longa, boa e pacata carreira num banco estatal. Um sagaz e sincero observador da condição humana ouviu-o dizer mais de uma vez: “Dez coisas que as pessoas fazem no trabalho, nove são geralmente inúteis. A décima costuma ser uma bobagem. Digo isto com base nas coisas que eu mesmo fiz”. Exagerado, grandiloqüente, provavelmente. Mas será que é tão distante assim da realidade?
Sou uma escritora barata. Não tenho carteira de trabalho. Mas gostaria de lembrar uma frase preferida de Mário, que fez uma longa, boa e pacata carreira num banco estatal. Um sagaz e sincero observador da condição humana ouviu-o dizer mais de uma vez: “Dez coisas que as pessoas fazem no trabalho, nove são geralmente inúteis. A décima costuma ser uma bobagem. Digo isto com base nas coisas que eu mesmo fiz”. Exagerado, grandiloqüente, provavelmente. Mas será que é tão distante assim da realidade?
Esqueça
agora mesmo a empresa. Seu tempo é livre? Pois então você se sente compelido
interiormente a ocupá-lo. Você pega o celular e telefona a 1ª pessoa que venha
à mente, mesmo que não tenha o que dizer. Ou então se instá-la em frente ao
computador e entra e sai de chats. Você sobe a escada. Depois desce. Todos nós
fazemos isto. Subimos escadas e descemos como as formigas de Sêneca. Sem
propósito. Apenas porque não conseguimos ficar sozinhos com nós mesmos.
Registro
aqui o Elogio do Ócio, numa época de tantos movimentos por nada, de tanta
agitação sem nexo. E penso, comovida, numa canção de John Lennon. Ouço-a
mentalmente. Watching The Wheels. Olhando para as rodas. Ele dizia que as
pessoas estranhavam vê-lo sentado, de olho nas rodas dos carros que passavam e
passavam. “Apenas gosto de vê-las girar”, disse John. John Lennon nesse momento
foi tão sábio quanto meu amigo Mário, quanto Sêneca, quanto todos aqueles que
se insurgem contra a fuga automática e neurótica de si mesmos.
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